quarta-feira, 28 de julho de 2010

"todo o amor que sentimos cá dentro"

A propósito da citação feita por uma amiga, de uma frase de Truman Capote, que dizia ''Todo o amor que sentimos cá dentro é natural e belo, só os hipócritas é que censuram uma pessoa por amar.'', poder-se-ia considerar o seguinte:
Nem todo o amor é natural e belo (será necessário apresentar disso exemplos?...), e há formas de amar censuráveis. Inclusive, não estou seguro de que se não tenham cometido mais atrocidades em nome do amor do que, por exemplo, em nome da religião, sendo que este último caso está, de certa forma e na minha opinião, contido no primeiro.
O que é o amor? Em que consiste a tradução prática desse termo para cada um dos indivíduos? - Diz-me como vives um sentimento (como é influenciado o teu comportamento por determinado sentimento), e eu poderei dizer-te quem és. Diz-me somente o que sentes, e eu dir-te-ei quem és ou não.
A única forma de aquela ser uma afirmação válida, é assumir que o autor define amor como sendo algo diferente daquilo que sentem os que cometem crimes e atrocidades em seu nome.
Ao tentar fazer um discurso perfeitamente identificável, que procura incluir as formas marginais (na época) de amor na esfera da "normalidade" (e subscrevo obviamente o elogio do amor enquanto pura dádiva mútua entre dois seres humanos, livres e auto-determinados, que assim se unificam), o autor desconsidera o erro de poder chamar pelo mesmo nome atitudes que fomentam consequências completamente opostas, fazendo depender da genuinidade do sentimento a sua legitimidade. Nada mais errado e perigoso.
Em nome do amor já se cometeram violações e destruíram vidas. Será no entanto isso para si ou para mim amor? Não.
Em nome do amor conjugal, parental, nacionalista,  corporativista, já se cometeram homicídios e genocídios, perseguições e destruições. Será isso para si ou para mim amor? Não.
Há formas de amar (ou o que se possa chamar a esse sentimento) que necessitam da servidão do objecto amado para poderem alimentar as necessidades de quem "ama". Será isso amor?...
Por isso, nem "todo o amor que sentimos cá dentro" é necessariamente digno do nome e de ser aceite pelos outros, seus destinatários ou não. O epíteto amor não é uma lixívia moral que branqueie maus sentimentos, defeitos de carácter ou vícios de personalidade.

O ser humano terá que adquirir a mestria em lidar com a ideia de poder, seu desejo e exercício - o maior desígnio humano e único verdadeiramente libertador e precursor da evolução da nossa condição. Só depois se poderá moderadamente auto-elogiar, e aos seus sentimentos. Antes desse dia, estará a alternar os auto-elogios com as guerras, injustiças e desumanidade que fomenta em nome, por exemplo, do amor, que nestes casos não é mais do que o nome do(s) próprio(s).